20 março, 2006

No jornal de vidro, leia-se na porta da Pulga

“ TRAQUINICES DE UM SERVO DE EL-REI
I
Porquê El-Rei
Me cortais a Pila?
Sabeis, meu senhor que,
Naquele celeiro, mergulhava
Apenas nos
Saiotes de vossa excelsa
Esposa. Por lá procurava o seu
Intocado bichinho, o
Peluche de vossa alteza.

II

Lembrai-vos,
Meu senhor que,
Quando me chamaste às
Vossas lides, eu já era
Eunuco; a vossa esposa,
Excelência, já só me afagava a
Cabecita, sob tais intocáveis
Saiotes, por si, senhor
Meu rei, almejando encontrar,
Tal bichinho.

III

Assim, senhor,
Deixai-me ficar com a
Pilinha, coitada, tão
Pequenina, porque a vós
Meu rei amado, também
Ela poderá venerar-vos
Com serventia”.

2006-03-14
V. de Liquito


21.3.06 Entre minutos de silêncio Pulga comemora a Poesia com o seu monstro. Aqui no corredor da morte reproduzimos com a devida autorização do autor, uma comunicação que o mesmo debitou em Guimarães vai para uns anos.

“Um poeta sem cornos é como um jardim sem flores
A. DASILVA O.


O Poeta é um enterrado vivo, todo o seu interior é, para o homem-comum, uma urna. Ao viver a sua (dele) morte depois da vida o Poeta enfrenta-se como a essência do homem-comum



Sou escravo duma imaginação doentia não faço outra coisa senão satisfazer-lhe todas as suas necessidades, uma a uma, em círculo fechado, a loucura profética (o frenesi), a loucura ritual ou mistérica (a mania), a loucura poética (a melancolia) e a loucura erótica (a imbecibilidade), sempre alegre e feliz. Tento dar o meu melhor. Ser criativo, pois o êxito está na razão directa da criatividade face à crueldade do mundo, onde infringir os limites de outrem, mesmo de matar outrem, pode constituir uma legítima defesa, uma resposta lógica. É que alma-multidão necessita urgentemente de respostas, um maior número de ideias, de pontos de vista, de hipóteses de solução. Não há ponta por onde se lhe pegue. Dê para onde der. É poibido fazer pensar. Não há emoção que suporte este ambiente de cortar à faca. Este livro. Este filme. Esta peça musical. Esta exposição. Neste palco tudo é fácil, tudo é simples, tudo é brilhante. Ninguém deve sair deste espectáculo, ou desta depressão, vivo. Muito emotivas e de fácil entendimento. Claro, a acção é essêncial. Uma acção amorosa com poucas imagens em agonia. Nada de enlatados convencionais de palavras que denunciem toda uma revolta, mas sim toda uma cólera conservadora e reacionária de joguinhos de palavras que se desfaçam em emoção. Mas este esforço. Esta máscara de esforço individual merece ser um reconhecimento público. O cliente tem sempre razão. A sua mente brilhante não deve ser insultada. Os seus gostos não devem ser discutidos. Era só o que faltava. É preciso premiar todos quanto se esforçam para que tudo seja fácil, simples e lucrativo. Aqui. Especialmente aqui, não devemos ser tradicionais. É um direito mais que humano, que nos assiste de premiar todo este esforço, antes que seja tarde demais. E mais uma vez, só depois de mortos é que são devidamente recompensados. Mas isso acabou. Estamos num novo ciclo da arte de viver. É bom viver no útero materno. A minha infância, foi, quer dizer ,é, Um Poema Puro toda ela passada na Idade Média. Existe felicidade maior? Não podia ser outra coisa, senão aquilo que sou. Está escrito. E a minha vida é um livro aberto, onde se desenrola um valor supremo de equilíbrios, de que todo o Poeta é mortal. Daí ser significativo que a imagem do Poeta esteja ausente do conjunto da literatura moderna. O raciocinio é clássico “a sociedade cria os seus próprios criminosos para se libertar, contra eles,das suas tendências agressivas. A sociedade precisa de criminosos para fundar e alimentar a sua cultura “(Karl Bednarik). Escrever é criminoso. O Poeta não participa neste banquete e daí o divórcio, a negação vital, na dupla leitura do mito de Édipo, uma freudiana, a outra heideggeriana ou platónica: o drama do incesto e o drama da verdade onde o poeta e o criminoso se olham nos olhos como dois amantes. Olho-me ao espelho e a minha imagem não se reflecte. Coloco a máscara e agora sim, a imagem da sociedade reflecte-se regularmente no local do crime onde todo um trabalho iconoclasta confirma “A liberdade individual não é um
bem cultural” (Freud). Cultura ou liberdade individual eis a nova barbárie. O duelo do Eros e-
terno quando no seu leito de morte encontra a sua amada (Afrodite) nos braços de Orfeu, o retorno recalcado, e masturba-se na liberdade poética ou filosófica” de Sade a Holderlin e de Nerval a Nietzsche, o mergulho puro numa linguagem que abole a história e faz cintilar, na superfície mais precária do sensível, a iminência de uma verdade imemorial”
(Michel Foucault).”

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