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Nunca mais parou de ser perseguido pelo filho da puta do Homo
Sapiens como me confessou numa entrevista para a revista Última Geração 4/5 maio/Junho de 1987 «Acho que ninguém
quer morrer sozinho. Ser morto pode dar por instantes a ilusão da imortalidade.
Os heróis correm atrás disso duma maneira, os artistas doutra. Cada herói e
cada artista cria actos e palavras para todos os gostos, cria modelos. Estes
modelos são uma doença incurável, um autêntico cancro do cérebro. A maioria dos
artistas não faz mais que fomentar cancros do cérebro. Eu inclino-me mais para
o género SIDA, acho mais catita «limpar» as defesas do parceiro que engordá-lo
com tumores. A maioria da arte que se faz hoje é um tumor» e Alberto Pimenta
tem cumprido essa Epopeida poética, em caixa alta, «porque é bom de ver que se
trata: o mundo transferiu para o écran o que costumava mostrar cifrado num
livro, letra a letra. Foi uma conquista dos analfabetos, e ainda bem» ele
também conquistou e conquista jogando com as armas (defesas?) do adversário «a
minha cara incomoda tanto filho da puta, que só isso já é um regalo» umA Divina Multi(co)media, &Etc, 1991, bêbada
de Metamorfoses do Video, José Ribeiro
editor, 1986 o que ao longo do tempo Alberto Pimenta tem
corroído com magia as máscaras e os rostos do logos e toda a sua arte de matar: «Mas mais e melhor ainda mata o
museu, e a biblioteca em certos casos. As obras estão vigiadas como
prisioneiros. Só podem visitar-se sob tutela e a certas horas e dias.» in A Magia
que Tira os Pecados do Mundo, 1995, Edições Cotovia.
E aqui se prova e se
comprova: uma vida inteira a bater no mesmo teclado «Essa é a magia, guardada
em 22 letras e seus traços de união» do eterno retorno à sua terra/jaula/livro
entre vómitos e náuseas e suores de quem não sai do sua catártica e ética
tarefa «Eu, Alberto Pimenta, nasci cerca de 750 anos depois de Alberto Magno, o
qual conhecia 4 variedades de rosas (mais duas que eu), e ainda outras magias
apreciáveis, que deixou registadas no Grande
e no Pequeno Alberto. E algum que fosse só Alberto, sem ser grande nem pequeno, não havia? Parece impossível,
mas a história não deixa: todos hão-de ser uma daquelas duas coisas. Essa foi a
grande descoberta da minha vida, foi como a descoberta de Copérnico: quem dá as
dimensões é a História, e a plebe erudita tira por aí as medidas para fazer os
fatos. Hoje vou tirar eu as medidas, com outras dimensões, se V.Exas não se
importam.»
Moral da História: dos
Poetas não reza a História.
É nesse e
esse o inferno que Edgar Pêra narra, escreve e disseca Alberto Pimenta segundo
as suas próprias palavras.
Foi nas Conferências do Inferno, segunda edição,
1994, Última Geração 22,23 e 24, que se encontraram e que vieram a dar
origem, em encontros futuros, a estes dois filmes:
- No primeiro Fiquem Qom a Qultura, eu fiko komo Brazzil,
o Grande e o Pequeno Alberto ironizam sobre si o estado do ser. E se um mija e
caga no outro, este, exerce a cidadania encobrindo a miséria do mundo com
jornais culturais.
Alberto
Pimenta liquida magistralmente esse «desejo» poético de querer ser um outro, Rimbaud, e como escreve Carlos Nogueira in A Sátira na Poesia Portuguesa, Fundação
Calouste Gulbenkian, 2011 «construindo mundo singulares, únicos, bizarros,
dá-nos a ver, num jogo fértil em analogias, mundos que afinal são os nossos»
sem ceder «a qualquer forma de facilidade ou indulgência, nem apresenta ou
insinua respostas lineares; de vocação polifágica, questiona as rotinas, as
intemperanças da sentimentalidade e do conformismo, os consensos estéticos que
não deixam descobrir novos ângulos no real, os excessos dos saberes e dos poderes
instituídos».
- No segundo,
3 Dias com Alberto Pimenta,
Alberto Pimenta está no Paraíso e narra, durante três dias, ora por fora, ora
por dentro, as voltas dadas no túmulo, Portugal, e das suas línguas. Duas. Uma
erudita, outra popular. Entrelaça-as libidinosamente na garganta funda do
estado poético. O estado dum país de poetas que se dá ao trabalho de
vilipendiar com um «riso de uma inteligência aberta, perscrutante e corrosiva»
Carlos Nogueira.
Alberto
Pimenta psicanaliza-se durante o mover do seu discurso no útero, no sexo, no
corpo da mãe fálica que não pára de escrever, a dormir, a sonhar acordado ou a
ler, com requintes de talhante, a sua obra «Morreu. Eu deitei-lhe mau-olhado.
Quando ela saiu do seu canto. Foi sem querer, mas isso não atenua a culpa. Aos
olhos do diabo, isso não atenua a culpa. À semelhança de todas as forças de
segurança e de todas as enfermarias de hospitais psiquiátricos, o diabo julga e
executa segundo o que acha mais conveniente.» in A Divina Multi(co)media.
E o Discurso Sobre o Filho-da-Puta, Teorema,
1977? Enquanto não fizer parte
oficial dos programas do Ciclo será lido como elogio fúnebre.
A. Dasilva O.
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